"Para sempre é sempre por um triz"...
Ela não era a mesma. Ele sabia disso e lhe havia dito antes de tudo começar. Tecnicamente, não haviam brigado, pensava Severo. Michele não era ela mesma, então aquilo não contava nem como acidente entre os dois, porra.
Haviam se conhecido há bem pouco tempo, quando ele procurava o amor de sua vida. O jogo era simples, pedia para amizades recentes ( se é que isso existe) que lessem em voz alta Las ruinas circulares, isso o excitava em todos os aspectos, reparava na boca de suas amigas, na entonação, na pronúncia, o Espanhol, para Severo, era a língua mais lasciva do mundo. Quando esbarrou em Michele, sentiu uma coisa estranha, como se a conhecesse de outros carnavais (não que ele gostasse ou fosse a esse tipo de festa). Perguntou-lhe se falava Espanhol, imediatamente Michele começou a falar e disse, em espanhol, que era fluente em Quechúa.
Severo sacou do bolso um exemplar de Narraciones, botou nas mãos de Michele, que abriu acidentalmente nas Ruinas. Foi amor ao acaso (ou a primeira vista). Imediatamente, Michele começou a ler. Nadie lo vio desembarcar em la unánime noche, nadie vio la canoa de bambú sumiendose an el fango sagrado...
Olhava as mãos cheia de sangue, tentava recompor toda história. Pequenas discórdias e aborrecimentos menores, tudo o que conseguia lembrar. Costumava ler seu signo no jornal, lembrou-se de que naquele dia lera: brigas sem causa ou razão. Lembrou-se também de ter discutido algo sobre dinheiro que deveriam pra ela. O sangue secava em suas mãos, enrigecia a pele, tinha um cheiro repugnanate.
Foi ao banheiro para lavar as mãos. Enquanto as enxugava, reparou no espelho que estava mais bonito. Sorriu. Voltou para o quarto. Agarrou o corpo de Michele e o colocou na cama. Ele disse que não confiava mais nela. Ela disse que estava tudo acabado. Era culpa dela. Ela se denfendeu dizendo que era fantasia.
No ônibus Michele lia o jornal. Naquele dia um rapaz, com cara de universitário sentara ao seu lado, lia Borges. Ela puxou papo, comentou a violência em São Paulo. Um dos cadernos do jornal escorregou de seu colo, o estudante o recupeoru antes de tocar no chão e tocou em uma de suas pernas, no processo de salvamento. Daí a imaginação de Michele viajou (para a proposta indecente e a questão do dinheiro foi um pulinho).
Quando os policiais chegaram por causa dos vizinhos (é sempre bom ter vizinhos nessas horas) a única coisa que eles entenderam foi o penúltimo parágrafo. Estavam todos otimistas porque tinham certeza que Severo era o assassino. A única dúvida era de Severo que não sabia como tudo começou, mas sabia que um dia tudo acaba.
(Marina o otimismo está na última linha)
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